Saiba se seu filho é vítima de bullying e o que fazer para evitar

Em entrevista à jornalista Giorgia Cavicchioli, do R7 da Record, a Psicóloga Tatiana Berta fala sobre o contexto em que o bullying está inserido e dá orientações sobre como lidar com o problema. Confira na íntegra:

 

O recente lançamento da série 13 Reasons Why e a morte de uma adolescente de 14 anos dentro da sala de aula em Porto Alegre relembrou a importância do combate ao bullying.

Na série dos Estados Unidos, uma menina comete suicídio por ter dificuldades de relacionamento na escola. Aqui no Brasil, a menina que era alvo das humilhações foi assassinada em plena sala de aula.

R7 ouviu a psicóloga Tatiana Berta Otero, terapeuta comportamental e cognitiva pela USP (Universidade de São Paulo) e mestre em saúde coletiva pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), para tirar as principais dúvidas dos pais sobre o bullying.

R7: Como detectar que o seu filho está passando por um problema de bullying na escola?

Tatiana Berta Otero: Qualquer mudança de comportamento precisa ser considerada pelos pais ou por quem convive com a criança ou adolescente vítima de bullying. A depender das características pessoais, pode ocorrer isolamento, irritação, recusa de ir à escola, dificuldades com o sono (pesadelos, insônia ou despertares noturnos), dentre outras possibilidades.

R7: Como orientar para superar isso?

Tatiana: A palavra bullying tem seu significado associado à agressividade: do inglês “bullying”, pode ser entendida como “briguento” e refere-se à violência verbal ou física direcionada a alguém que se encontra em possibilidade desigual de defesa. A orientação a ser dada pelos pais ao filho que está sofrendo este tipo de violência, seja na escola ou em qualquer âmbito social é a de que saiba que não está sozinho e que pode contar com o apoio e ajuda (e assim se espera) de outras pessoas próximas.

R7: Qual o papel dos pais nessa tarefa?

Tatiana: O acolhimento oferecido pelos pais, cuidadores, escola e demais conhecidos é um importante suporte para que a criança não se sinta desamparada e excluída, como pretende quem pratica o ato. O acolhimento é a porta de entrada da comunicação, portanto é fundamental que o filho se sinta seguro para compartilhar suas vivências e sentimentos desde cedo. Ouvir a criança com atenção, mesmo quando não se trata de uma questão que a coloca em risco, é um grande passo para conquistar a confiança necessária para que aprenda a falar, desde cedo.

R7: Quais os sintomas que os pais devem considerar?

Tatiana: Não desconsidere o relato de seu filho e, ainda que lhe pareça sem importância, ouça com atenção e gentileza. Esta atitude por si só já o educa para o respeito e consideração com o próximo. A criança reconhece quando o adulto está atento a sua fala ou quando está apenas dividindo a atenção entre o que está sendo ouvido e as demais demandas do cotidiano. Oriente, desde cedo, seu filho a reconhecer o que está sentindo: aprender a expressar que está triste ou com medo o ajudará a valorizar tais sentimentos, nos momentos de perigo ou mesmo de frustração. O medo é um importante sinalizador de ameaça e jamais deve ser desconsiderado. Aprender a dizer “não gostei do que você fez” e, em seguida, pedir auxílio do adulto mais próximo, muitas vezes até mesmo para o professor, já é um grande treino de assertividade. A criança, sozinha, não consegue simplesmente “dar de ombros” ao agressor e à “plateia”, portanto é muito importante que esteja constantemente monitorada nos ambientes, enquanto ainda não tiver maturidade para que possa defender-se.

R7: Como detectar que o seu filho está sendo a pessoa que faz bullying com alguém?

Tatiana: O respeito começa em casa, por meio do exemplo que temos no convívio em família. O autor do bullying geralmente aprende tais atitudes no próprio lar. Se a criança tem atitudes agressivas ou desafiadoras constantemente, é provável que repita este padrão em outros contextos, especialmente no escolar, onde passa a maior parte do tempo em que não está com os familiares. O acompanhamento da rotina escolar por meio de recursos como agenda e comparecimento às reuniões é de responsabilidade dos pais e fundamental tanto para que se conheça melhor sobre o funcionamento da criança como para que ela se sinta acompanhada nas atitudes que toma na escola.

R7: Como orientar ele para não fazer mais isso?

Tatiana: Sendo o bullying um problema social, ou seja: que está presente nos diferentes meios em que a criança ou adolescente está inserido, a orientação deve ser dada sempre em conjunto, a começar pela família, que deve ser a primeira a se posicionar. Conversar com a criança, auxiliando-a a desenvolver empatia e compaixão, incluindo por si própria, compreendendo que não se deve fazer ao outro aquilo que não queremos que façam a nós, é o primeiro passo. Já diante da situação deflagrada, é importante orientar sobre as consequências para todos os envolvidos e, seguindo a premissa anterior, fazer com que a criança se desculpe e se comprometa com as consequências (lembrando que isso provavelmente só será possível se houver monitoramento por parte de todos os envolvidos).

R7: Suicídio pode acontecer por conta de bullying? Em quais casos?

Tatiana: O alvo do agressor ou do grupo de agressores muitas vezes é alguém que já está com pouco apoio familiar e apresentando características de insegurança ou autoestima comprometida. Em alguns casos, a própria vítima possui a autoconfiança tão fragilizada, que poderá equivocadamente sentir-se obrigada a tolerar os maus-tratos sofridos. Tal situação acarreta diminuição de energia e isolamento, que implicam numa crescente perda dos reforços sociais (apoio ou situações de prazer), que são importantes meios de prevenção de doenças, como a depressão. A depender das características individuais, as situações de bullying podem agravar quadros já instalados de doenças como ansiedade e depressão, aumentando, portanto, o risco de suicídio ou comorbidades.

R7: Assassinatos podem acontecer por conta do bullying? Em quais casos?

Tatiana: A depender da intensidade e frequência das agressões a que a vítima é exposta, não se pode deixar de considerar o bullying como uma forma de assassinato, ao menos do ponto de vista psíquico. Além disso, estudos indicam que os agressores, em situações de bullying, na vida escolar, apresentaram envolvimento com a criminalidade na vida adulta.

R7: Como punir um responsável por isso? Existe punição?

Tatiana: Toda vez que uma criança ou adolescente sofre bullying, a sociedade como um todo é punida. Os danos não ocorrem somente para a vítima, prejudicada em suas funções sociais, mas se estendem para todos os que poderiam ter os benefícios da convivência pacífica e agregadora comprometidos. Existe jurisprudência para casos de bullying, no entanto educar as crianças para a afetividade e gentileza, além de envolver-se efetivamente na vida escolar deles, é a mais segura forma de prevenção, além de ser base de uma educação estruturada.

R7: Quantas crianças sofrem com bullying no Brasil?

Tatiana: O contexto brasileiro, como ocorre no cenário internacional, tem apresentado um cenário de bullying com motivações diversas, nas diferentes regiões. No Brasil, em 2010, um estudo com amostra de 5.168 alunos de quinta a oitava séries de escolas públicas e privadas nas cinco regiões do País caracterizou bullying por agressões com frequência superior no ano e identificou 12,5% de vítimas.