O trabalho pode substituir uma perda?

Nesta entrevista, concedida a um portal de saúde, o Psicólogo Paulo Sergio Estevam Ferreira (*), comenta sobre a relação entre trabalho e término de relacionamento:

Trabalhar muito pode ajudar a superar uma desilusão amorosa?

Se por desilusão amorosa entendermos o término de um relacionamento, podemos pensar que não ajudará a superar, porém poderá ajudar a “sair um pouco”, a “não pensar” na situação que está causando sofrimento – como uma forma de compensação, uma  substituição de algo que está nos faltando naquele momento. Todo relacionamento amoroso vai sendo construído  aos poucos,  baseado em troca mútua, em promessas, em momentos de carinho e cumplicidade – é o que se pode chamar de reforçamento – o casal vai constantemente reforçando o comportamento do outro e, ao mesmo tempo sendo reforçado por ele – a consequência é o bem-estar que sentem quando estão juntos.

No momento em que um dos dois interrompe esses reforçamentos, o outro não sabe bem como agir, fica confuso e sem parâmetros do que está acontecendo com a  relação, e, sem o outro, sente como se não pudesse ir muito longe. Então, acontece o rompimento, a separação e também uma grande desilusão em relação ao outro, que até o momento havia sido tão presente e tão disposto. Algumas pessoas nesse momento podem  “mergulhar” em outros comportamentos – como o de trabalhar em excesso – pois aí nesse momento, talvez, o fruto de seu trabalho (as consequências ) digamos, é o que passa a ser reforçador e interessante – nada além disso, e quanto mais a pessoa vai produzindo, mais vai se sentindo recompensada. Ela começa então a emitir outro comportamento , o de trabalhar  por exemplo, com  a mesma função – o prazer e a satisfação pessoal.

Tentar substituir o amor pelo trabalho funciona para todas as pessoas?

Provavelmente, esse comportamento de buscar recompensas/reforçadores em algo outro que não seja mais a relação amorosa, e sim no trabalho, se aplica a muitas pessoas, e talvez seja funcional por um determinado período de tempo. Podemos pensar que a “propensão” de cada pessoa dependa também do quanto ela investia na relação que terminou, do quanto ela reforçava e era reforçada pelo parceiro, bem como o quanto o ambiente no qual ela está inserida irá proporcionar essa possibilidade, ou seja, isso dependerá também do quanto a pessoa gosta do seu trabalho e do quanto se sente valorizada, recompensada por ele.

Essa não poderia ser somente uma forma de fugir do problema?

Poderia ser uma forma de tentar manter a mesma sensação de prazer, de bem-estar que tinha quando estava ainda vivendo a relação amorosa – uma manutenção daquele reforçamento com a qual estava habituada, bem como evitar o desconforto que a privação desses reforços pode causar. Provavelmente não se trate de uma fuga, mas sim de uma forma de esquivar-se dos sentimentos dolorosos que a ausência de reforçamento do parceiro esteja lhe causando.

Não seria melhor procurar “viver” essas situações e aprender com elas, do que evitar e se enfiar no trabalho?

Esse comportamento de entregar-se demasiadamente ao trabalho não deixa de ser uma maneira de não confrontar-se com a situação, evitando-a. É importante lembrar que, de qualquer maneira, o indivíduo acaba vivendo a situação, querendo ou não, “fugindo ou não”. De acordo com o Behaviorismo, de B.F. Skinner, o homem age no mundo modificando-o, e ao mesmo tempo é modificado pelas consequências de seu comportamento. Esse trabalho em excesso trará consequências reforçadoras para a pessoa, porém há que se pensar no que aconteceu, ou no que foi acontecendo durante a relação que gerou essa mudança de comportamentos levando ao término da relação e à desilusão amorosa. Sem buscar compreender esses fatos ficará difícil superar o desapontamento e normalizar a vida cotidiana, podendo então buscar reforçadores outros que não seja somente o trabalho.

Paulo Sergio Estevam Ferreira

CRP: 06/93350

Psicólogo Clínico com especialização em TCC – Terapia Cognitivo-comportamental

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