Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade: quando procurar ajuda?

Agitação, dificuldade para prestar atenção às instruções e impaciência são comportamentos cada vez mais característicos nas nossas crianças, inseridas na dinâmica cada vez mais “veloz” de um mundo repleto de estímulos e recursos inimagináveis.

No entanto, por vezes é bastante difícil distinguir essas características de um problema que requer cuidado. Até que ponto as crianças estão apenas aprendendo a serem mais “ativas” pela necessidade que se apresenta ou essa hiperatividade é característica de um quadro clínico a ser tratado?

A literatura aponta, historicamente, uma preocupação com o padrão do atualmente denominado “Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade – TDAH”, há mais de um século, quando os médicos já trabalhavam com pessoas com sintomas de desatenção, impaciência e inquietação, porém somente em 1987, houve a formalização do termo, utilizando-se para diagnóstico dois grupos de sintomas: a)desatenção e b)hiperatividade/impulsividade. O TDAH é definido como um problema de saúde mental, com grande impacto na vida familiar, escolar e social das crianças. As possíveis causas podem estar relacionadas com fatores que vão desde hereditariedade à problemas no funcionamento familiar. A característica essencial é o padrão persistente de desatenção e/ou hiperatividade mais frequente e intenso do que aquele observado em crianças da mesma faixa etária ou de desenvolvimento. Estudos sugerem que os cérebros de crianças com TDAH funcionam de maneira diferente das que não o tem. Elas são, muitas vezes,“rotuladas” como indisciplinadas, desobedientes ou preguiçosas. O nível de estresse no âmbito familiar passa a ser alto, devido às consequências geradas pelo descumprimento das demandas ou expectativas. Muitas vezes, os pais e todos os que convivem com a criança sentem-se confusos com relação às atitudes a serem tomadas, sendo frequentemente chamados por professores e coordenadores pedagógicos para conversar.

​São exemplos de comportamentos que podem requerer atenção (lembrando que o diagnóstico só é fechado por um clínico, na presença de um padrão de sintomas por um certo período de tempo):

– A criança não consegue manter a atenção em detalhes. Na escola, por exemplo, “esquece” de anotar metade da frase ou não presta atenção ao sinal do cálculo, errando o resultado, ainda que saiba efetuá-lo e parece não escutar,quando é chamada. Os materiais são desorganizados e a perda dos mesmos ou das tarefas é frequente;

– É comum a evitação de atividades que exijam persistência ou esforço mental como a leitura de um livro. A distração que, muitas vezes, é confundida pelos adultos como “preguiça” é comum, quando a atenção é levada para outros estímulos como sons externos, por exemplo;

– A atividade corporal pode ser excessiva, sugerindo inquietação, ex: remexer-se na cadeira, permanecer de pé – quando deveria estar sentado, não conseguir ficar em silêncio durante as atividades etc.

– A impulsividade se manifesta como impaciência e imediatismo, por exemplo: dificuldade de aguardar a vez numa fila, interferência nos assuntos alheios, fazerperguntas antes de ser chamado ou responder algo que não lhe foi perguntado, dentre outras possibilidades.

​Sendo o processo do desenvolvimento de atenção um requisito para o desenvolvimento de diversas habilidades,incluindo-se aí, as que estão relacionadas ao meio social, a identificação e cuidado desde cedo se tornam necessários, a fim de que a criança não seja prejudicada. Muitasvivenciam histórias de sofrimento, quando seus sentimentos não são considerados ou compreendidos. Muitas vezes, há outros transtornos associados ao TDAH, como ansiedade ou depressão e que requerem orientação profissional, a fim de que todas as variáveis envolvidas no processo sejam avaliadas. O tratamento deste quadro clínico normalmente é feito com psicoterapia e orientação (psicoeducação) familiar, além do auxílio medicamentoso, em alguns casos. Um programa de favorecimento do desenvolvimento de autocontrole pode ser necessário, a fim de que a criança aprenda, de forma gradual e progressiva, a monitorar o próprio comportamento e a fazer escolhas.

​É importante lembrarmos que nem todo comportamento de hiperatividade ou desatenção pode ser característico de um transtorno a ser tratado. Muitas vezes, o próprio padrão que a criança está formando decorre das experiências e dos modelos que recebe em seu próprio ambiente. A falta de organização em casa ou mesmo de limites e previsibilidade podem favorecer na criança um padrão de ansiedade como tentativa de controle. Cabe sempre observar que agimos com o objetivo de nos adaptarmos ao contexto em que estamos inseridos e tornam-se necessários a compreensão e o olhar empático para cada criança com sua história de vida e necessidades.

Tatiana Berta Otero (CRP 06/93349)*

Paulo Sergio Estevam Ferreira (CRP 06/93350)**

*Psicóloga Clínica, Especialista em Terapia Comportamental e Cognitiva/USP, Mestranda do Depto de Medicina Preventiva da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)

** Professor, Psicopedagogo e Psicólogo Clínico, Especialista em Terapia Comportamental e Cognitiva/USP