Em algum momento, você já assistiu ou protagonizou uma cena como esta?
“E… finalmente você senta, decidido a começar a estudar para a prova de amanhã cedo, mas antes dá só uma “olhadinha” nos emails, afinal de contas pode ter algo importante, não é? Pronto, agora já dá pra estudar, mas antes só uma passadinha rápida pela página rede social, pois vai que alguém deixou alguma dica interessante?! E, de repente, já se foi meia hora e o tempo de estudar está diminuindo… “Bom, força, a prova é amanhã e ainda restam algumas horas, vamos lá”, você pensa. Então, abre o livro, afinal precisa decorar somente alguns artigos do Código de Ética Profissional, mas agora dá uma vontade danada de ir ao banheiro… “Tudo bem”, você pensa, “vou lá rapidinho e já volto para estudar”. Ufa! Tentando se conformar, você diz a si próprio: “ainda dá tempo de estudar um pouco, afinal de contas, só uma lida já ajuda, né?” E… finalmente você senta, cansado, mas agora sim, decidido a ler os artigos para a prova de amanhã cedo, mas quer dar só uma última paradinha para espiar os recados na internet e… tudo se repete!” |
Certamente, a cena nos remete à algumas expressões como “empurrar com a barriga” ou “deixar tudo para a última hora”. Expressões que lembramos muitas vezes quando pensamos em “começar a dieta” ou “ir para a academia”, e que dizem respeito ao adiamento das tarefas, podem apontar para um padrão denominado “procrastinação”. A palavra “procrastinar”, muito usada atualmente, vem do latim pro-, “à frente” e cras, “amanhã”. Pro cras, portanto, pode ser ententido como “para amanhã”.
O ato de procrastinar, ou seja: adiar algo que depende de uma tomada de atitude, está relacionado ao esforço que precisamos dispender: dependendo da história de aprendizagem de cada indivíduo, quanto maior a dificuldade, maior a probabilidade de deixar a tarefa para depois. Muitas vezes, esquivar-se de uma dificuldade pode ocorrer pela tentativa da manutenção de uma zona de conforto imediata, ainda que se saiba que ela pode (e muitas vezes precisa) ser melhorada, a fim de que se obtenham consequências futuras favoráveis. O imediatismo que aprendemos nos nossos tempos, muitas vezes promove uma espécie de “solo fértil” para trocarmos o esforço, que nem sempre traz resultados imediatos, pelo “descanso” ou prazer imediato. São diversas as situações em que este comportamento ocorre e podemos citar desde a simples arrumação de um armário ou estudar para uma prova, até mesmo optar por faltar um dia de trabalho. Nestas situações, o adiamento pode trazer consequências ambivalentes: juntamente com o alívio imediato por permanecer mais um pouquinho na zona de conforto, ocorre o mal-estar em saber que o que ficou para trás continua lá, “esperando” e acarretando algum prejuízo, mais cedo ou mais tarde. De fato, podemos dizer que alívio e ansiedade, neste caso, passam a concorrer e que, esta “mistura” pode servir de “combustível” para mais desorganização.
Para que um comportamento seja fortalecido é necessário que consequências importantes para o indivíduo o mantenham. Já que nem sempre os ganhos por uma rotina organizada ou pelo cumprimento de uma tarefa são tão imediatos quanto o alívio sentido quando adiamos o que é difícil de fazer, é necessário que algum ganho “rápido” possa concorrer com o alívio. Assim, para mudarmos um padrão procrastinador, uma boa forma é buscarmos o prazer proporcionado por “dar conta” das atividades do cotidiano. Para isso, algumas dicas podem ser importantes como estabelecer uma hierarquia de prioridades entre os afazeres e planejá-los dentro das possibilidades reais (tempo disponível) a cada dia. Neste caso, a boa e velha agenda de anotações constuma ser um bom auxílio. Começar pelo mais difícil pode ser interessante, pois maior energia é necessária no início (lembremos que os dias mais difíceis para se fazer exercício físico em academia são exatamente aqueles que sucedem ao momento da matrícula ou as duas primeiras aulas). Aos pouquinhos, o simples fato de ir “dando conta do recado” já se torna uma espécie de “fortalecedor emocional” e o exercício físico passa a ser reforçador, pelos benefícios imediatos e a longo prazo que promove. É importante lembrar que, ao utilizar a agenda, a cada tarefa cumprida, cabe sinalizar sua realização: vale “ticar” o apontamento, destacá-lo com caneta colorida e até mesmo permitir dar-se os “parabéns” pelo desafio realizado. O “retorno” imediato nos ensina que o hábito pode ser prazeroso!
Saber hierarquizar nem sempre é tarefa fácil para pessoas que tendem a se sobrecarregar por não saberem dizer “não” ou mesmo reconhecerem os próprios limites. Portanto, é necessário trabalhar também outro conceito bastante usado atualmente, chamado “assertividade”, que consiste basicamente no aprendizado das prioridades, sabendo dizer “sim” e “não” nas diferentes situações do cotidiano com seus inúmeros apelos. Leia um pouquinho mais sobre assertividade em:
http://tatianabertapsicologa.com.br/home/?p=1551
e
http://tatianabertapsicologa.com.br/home/?p=318
Nem sempre reconhecemos o que para nós pode ser reforçador, sobretudo quando nos encontramos em quadros de muito desgaste emocional ou sob controle de muita ansiedade. Da mesma forma, nem sempre conseguimos facilmente compreender porque estamos adiando tarefas possíveis de serem realizadas. Tudo o que se percebe é que o tempo passa e que não foi possível realizar o que se desejava, além de uma grande sensação de frustração ou fracasso. Às vezes, pode ser importante a busca por auxílio profissional. A psicoterapia ou a realização de um coaching profissional podem ser importantes ferramentas de auxílio. Por meio dos procedimentos da Terapia Comportamental e Cognitiva, por exemplo, é possível que o cliente, com a mediação do psicoterapeuta, comece a identificar nos próprios comportamentos, as variáveis que estão fazendo a manutenção do sofrimento, o que poderá auxiiar para a tomada de decisão e mudança.
O episódio “Delonga”, do desenho animado “Bob Esponja: calça quadrada”, mostra de forma bastante criativa a procrastinação e suas consequências para o estudante, ou seja: como os hábitos são aprendidos desde cedo. Se você tiver um tempinho e quiser dar boas risadas (ou até mesmo, se for o caso, observar similaridades com o próprio padrão), o desenho está disponível ao público na internet, no link a seguir: http://www2.videolog.tv/608896
Lembre-se de que toda mudança é realizada aos poucos, uma vez que aprender é um processo. Para melhorar um padrão de procrastinação, o primeiro passo é a AÇÃO!
“Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade.” (Edson Marques)
Tatiana Berta
Psicóloga e Psicoterapeuta Comportamental e Cognitiva
CRP Principal (06/93349)
São Paulo/SP
*O conteúdo do texto é informativo e não substitui a terapia realizada em consultório.